A importância do lúdico no processo de aprendizagem
Ramos se contrapõe a Kishimoto, quando afirma que ao se relacionar com o meio as crianças vão construindo o seu conhecimento e manipulando os dados da realidade através das variedades do lúdico, que são reelaborados e transformados. Para a autora, tanto a função lúdica quanto a educativa estão presentes nos jogos e brincadeiras, sejam eles espontâneos ou dirigidos; ou seja, para a autora, mesmo nas atividades lúdicas espontâneas a função educativa está presente, pois mesmo sem nenhum comprometimento com a produção de resultados, que é próprio das atividades educativas dirigidas, as atividades espontâneas são naturalmente educativas por ajudar na sua formação e desenvolvimento integral (física, intelectual e moralmente), na constituição da sua individualidade e na formação do seu caráter e da sua personalidade, implicando, portanto, sempre em alguma aprendizagem, seja de regra de jogo, de agir adequado, de compreensão de sentimentos, da relação com o outro ou com o mundo.
Luckesi (apud Ramos, 2000) vem enriquecer não só com um conceito de "Ludicidade" distinguindo-a de "divertimento":
"... um 'fazer' humano mais amplo, que se relaciona não apenas à presença das brincadeiras ou jogos, mas também a um sentimento, atitude do sujeito envolvido na ação, que se refere a um prazer de celebração em função do envolvimento genuíno com a atividade, a sensação de plenitude que acompanha as coisas significativas e verdadeiras"(pág.52),
mas, também, relacionando com o cotidiano em geral, inclusive com o trabalho, quando diz que essa sensação de plenitude só pode estar presente, em qualquer coisa que fizermos, se estivermos envolvidos com toda a atenção voltada às nossas ações, para percebermos o seu valor e isto para qualquer atividade humana, seja ela divertimento puro e simples ou trabalho, tarefa.
É quando Ramos enfatiza a necessidade de envolvimento tanto manifesto (suas atitudes, estratégias, etc.) como subjetivo (aspectos emocionais, sentimento de competência, autodeterminação) dos educandos e dos educadores, este último com entrega, dedicação e positividade, buscando no educando um sujeito ativo, e até interativo e inventivo; mas, antes, propiciando-lhe liberdade de ação (abundância de espaço para experimentar-brincar com coisas e idéias, para liberar corpo, mente, emoções).
Ramos também cita Rousseau quando afirma que a criança pensando e sentindo à sua própria maneira, não poderia aprender senão de forma ativa pensando a ciência ao seu modo e, assim, reiventando-a ao invés de repetir suas fórmulas verbais.
Há até os que acreditam que a criança aprende "mais nos jogos em grupo que através de muitas lições e folhas mimeografadas" (Ramos apud Kamii e DeVries), pela possibilidade de ser ativo nessas aprendizagens, além da interação social em que os mesmos implicam.
Se diversos estudos demonstram que a cooperação das crianças entre si é fundamental para o seu desenvolvimento, favorecendo o intercâmbio do pensamento e da discussão (desenvolvendo o espírito crítico, a objetividade e a reflexão discursiva) não estão distantes dos escritos de Vygotskypois, segundo ele, a criança usa"as interações sociais como formas privilegiadas de acesso a informações: aprendem a regra do jogo, por exemplo, através dos outros e não como resultado de um empenho estritamente individual na solução de problemas".Assim sendo, ela aprende a regular seu comportamento pelas reações, mesmo que elas pareçam agradáveis ou não.
Ramos se reporta a Kishimoto no que diz respeito à face dirigida dos jogos e brincadeiras, mostrando que mesmo modificados para promover aprendizagem de conceitos ou habilidades específicas, por sua intencionalidade na busca de resultados, eles podem perder suas características, tais como a liberdade de ação do jogador, flexibilidade, relevância do processo de brincar (que não precisa ter objetivo que não seja o próprio brincar, encerrando-se nela mesma, no seu processo), incerteza dos resultados (só se sabe como termina a brincadeira na hora que acaba), controle interno (os jogadores é que controlam a ação), intencionalidade do brincante (que é o que define a atividade como brincadeira ou não). A autora esclarece que para que o jogo didático não se descaracterize como lúdico, ou seja, não perca o status de jogo ou brincadeira, é preciso que a interferência do adulto deva se restringir tão somente:
"... à organização do tempo, dos materiais, e do espaço no qual as crianças se movimentam e não na atividade em si, permitindo à criança, a liberdade de 'ir' e 'vir' na atividade, bem como a flexibilidade para reordená-la, sem entrar em conflito com sua ação voluntária, admitindo a 'incerteza' quanto aos resultados tão comuns a estas atividades".
Kishimoto afirma ainda que:
"... quando as situações lúdicas são intencionalmente criadas pelo adulto com vistas a estimular certos tipos de aprendizagem surge a dimensão educativa. Desde que sejam mantidas as condições para expressão do jogo, ou seja, a ação intencional da criança para brincar o educador está potencializando as situações de aprendizagem".
No que Ramos conclui que para um "jogo educativo" se configurar como lúdico, a definição da atividade como tal, pelo educador, não basta; é preciso que exista a intencionalidade do brincante.
Podemos, então, afirmar que o sujeito do brincar, que é a própria criança, é que pode/deve definir a atividade como brincadeira ou não. E é a experiência e sagacidade da própria criança que vem nos sinalizar a quantas anda o lúdico nas atividades escolares.
O paradigma da abordagem lúdica na educação, como um meio de tornar este processo prazeroso, ainda não é totalmente concebível para a sociedade. Esta questão perpassa pela cultura que está arraigada em nossas mentes, pois se atribui à educação e ao lúdico espaços diferentes e muito bem definidos. Aos poucos, esta interpretação vem se mostrando inadequada, diante das escobertas realizadas por alguns teóricos que estudam estas duas áreas. É o que afirma Simão de Miranda quando descreve Cotrim e Parisi (1985, p.293), que numa releitura de Claparède, afirmam que a escola deve ser ativa, mobilizando a atividade da criança, servindo-lhe de laboratório para que a mesma possa tirar um partido útil do jogo; e então, sendo-lhe um meio alegre, fazê-la amar o trabalho, ao invés de detestá-lo.
Contudo, o lúdico enquanto "atividade criativa", apesar de propiciar prazer ao indivíduo, foi banido da dimensão educacional, pois cede lugar a uma prática pedagógica centrada nos aspectos cognitivos do processo de ensino-aprendizagem. Muitos professores tornam-se reticentes no que diz respeito ao lúdico na sala de aula. Alguns o encaram como um recurso pedagógico a mais, cuja finalidade é ser usado no desenvolvimento das aulas, perdendo assim a sua espontaneidade; outros o conceituam como um modo de ensinar e aprender mais compatível com a própria essência da vida, que é movimento, atividade, desenvolvimento e transformação.
Defender uma prática pedagógica a partir da atividade do brincar traz mudanças significativas para o processo de ensino-aprendizagem, pois nos remete à transformação do espaço escolar em um espaço integrador, dinâmico, onde não se prioriza apenas o desenvolvimento cognitivo do alunado, mas contempla uma dimensão onde ocorra uma formação plena do indivíduo.
Nesse contexto, a postura do professor possui grande relevância, pois ele pode conduzir suas atividades priorizando o lúdico ou negando-lhe o espaço, o que o faz negar, de certa forma, as "possibilidades" de pleno desenvolvimento do seu aluno. Sendo assim, faz-se necessário que a escola trabalhe com a diversidade cultural de seus alunos, valorizando a pluralidade, o movimento e a corporeidade, evitando, conseqüentemente, a linearidade, a passividade, a homogeneidade. Pode-se, então, pensar que, dessa forma, a escola tende a resgatar, no seu espaço, a vida, o dinamismo e o prazer, que há muito foram esquecidos, por conta de uma primordial preocupação em transmitir conteúdos, tidos como verdades universais.
CONCLUSÃO
É possível perceber que o campo da ludicidade ainda é pouco explorado pelas escolas e quando isso ocorre, por vezes, é feito de forma errônea, havendo pouca receptividade de alguns pais, devido a concepção do lúdico ser pouco compreendida. Talvez seja, ainda, pela falta de compreensão ou pela interpretação precipitada que as pessoas não conseguiram se apropriar, de fato, do seu real significado e importância.
O brincar é tão relevante para a criança quanto o trabalho é necessário para o adulto, por isso com intencionalidade educativa, ou não, de um modo geral, ele traz os dados do cotidiano para um fazer ativo, refazendo-os ao relacioná-los com o imaginário.
Ao brincar e experimentar o mundo dentro do seu contexto sócio cultural a criança constrói o seu fazer, repercutindo no futuro, o que seria a própria essência da vida.
REFERÊNCIAS
KISHIMOTO, Tizuko Morchida (org.). Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. 3ª edição, SP: Cortez, 1999.
KRAMER, Sonia e LEITE, Isabel (orgs.). Infância e produção cultural. SP: Papirus. Coleção Prática pedagógica, s/a.
MIRANDA, Simão. Do fascínio do jogo à alegria do aprender nas séries iniciais. SP: Papirus, s/a.
RAMOS, Rosemary Lacerda. Por uma educação lúdica. Tese (em construção) de doutorado, cursado na Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia. 2000.
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VAMILSON SOUZA D`ESPÍNDOLA
Graduado em Educação Física pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL); Professor de Educação Fisica na rede escolar do Municipio de Laguna e Arbitro da Federação Catarinense de Atletismo.Ver todos os artigos por VAMILSON SOUZA D`ESPÍNDOLA
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